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23.08.2023POR Lexi Narovatkin

Dos Palcos à Praia – Sonic Blast 2023 – 11ª edição

A Rádio Universidade de Coimbra cumpriu o seu compromisso de aliança à legião desértica, e esteve presente a documentar e a mergulhar no festival de Caminha.

A Praia da Duna dos Caldeirões deu lugar à 11ª edição do Sonic Blast, tornando Vila Praia de Âncora, pela segunda vez, arena para as hostes que seguem o Desert Rock, o Doom Metal e todas as ramificações da música que mói o ouvido humano. 

A Rádio Universidade de Coimbra cumpriu o seu compromisso de aliança à legião desértica, e esteve presente a documentar e a mergulhar no festival de Caminha. De Coimbra, partiu uma equipa composta por cinco elementos, Francisco Monteiro, Marta Anjo, João António Sousa, Diogo Barbosa e Bernardo Matos. Com o imprescindível apoio técnico de Vasco Santos, este ano houve a estreia de uma emissão especial diretamente da periferia do recinto do festival.

De dia 10 a 12 de Agosto, a RUC encontrou-se instalada na sede do Âncora Praia FC, onde estava alojado o dispositivo radiofónico que, das 17h às 18h, transmitia em direto para os 107.9FM todo o relato da experiência causada pelos altos decibéis e pela amplificação grotesca, meticulosamente artilhada pelos técnicos de som. 

Foi com músculos doridos e tímpanos rasgados que enfrentámos o percurso de 3 palcos que o Sonic Blast presenteou a cerca de 15 mil festivaleiros.

Dia 9

Warm-Up Oficial

As hostilidades sónicas abriam no Palco 3 com um alinhamento encabeçado por Plastic Woods, Ruff Majik, Scatterbrainiac, Nagasaki Sunrise e um DJ set de Branca Studio. Estreavam, também, as bancas comerciais do festival, desde a zona de alimentação e do merchandising, reunindo um público ainda embrionário prontíssimo a começar a experiência completa deste encontro.

As sonoridades do Palco 3 trouxeram sólidas enchentes humanas com um público já composto por volta do início do concerto de Scatterbrainiac, a banda de Punk do Porto que esteve à conversa com Bernardo Matos, e que aumentou na representação do Heavy Metal clássico com os Nagasaki Sunrise que disparavam sob o público instrumentos carregados pelos seus cintos de bala.

O Warm-Up terminava com um DJ set a cargo da plataforma de Barcelona, Branca Studio, também responsável pelo grafismo desta edição. Já nos momentos finais tocava Cumbia e a equipa da RUC retirava-se para o setor do campismo para recolher energia e preparar os trabalhos do seguinte dia.

Fotografia de Iago Alonso do concerto de Nagasaki Sunrise

Dia 10

O acordar no primeiro dia oficial de festival para a RUC foi breve e produtivo. Alguns campistas restantes estariam já a despertar com o ínicio do concerto de Desert’Smoke, enquanto a equipa de imprensa seguia para os entrevistar logo a seguir ao seu espetáculo. 

A tarde de concertos prosseguia a todo o vapor com Etran De L’Aïr com o seu rock originário de Agadez, contribuindo com mais uns grãos no deserto litoral.

A programação neste dia sofria uma pequena alteração horária, ao serem trocados os concertos de Death Valley Girls e Mythic Sunship dado a questões logísticas. Os escandinavos Mythic Sunship, também repetentes do festival, sentaram-se com Diogo Barbosa para falar sobre o percurso do seu projeto.

A servir de combustível para a tarde escaldante, a banda californiana Sasquatch, também entrevistada pela RUC, levava o público ao arrasto pelo chão e o mesmo registo se verificava na atuação de Crippled Black Phoenix. 

As energias elevaram-se com o Hardcore Punk de SPY, juntando sangue à mistura de areia e suor. O feitiço de imersão foi lançado pelos Acid King com o seu véu psicadélico com o cair da noite e a vocalista Laurie S. partilhou um bocado da dose do seu grupo em entrevista com Francisco Monteiro e Marta Anjo.

Uma onda de euforia e positivismo surgiu com Death Valley Girls, que tocaram sem a sua vocalista principal. O sentimento Punk ficou a perpetuar-se com o choque frontal causado por OFF!, supergrupo fundado pelo membro de Black Flag, Keith Morris e Dimitri Coats de Burning Brides.

Era impossível olhar para esta noite de festival sem reconhecer a titânica acumulação de fãs dos berlinenses Kadavar, que levaram os fiéis ouvintes ao êxtase com o seu repertório de rock psicadélico. Kadavar era um dos concertos mais esperados pelo público e atingiu, o que pareceu, ter sido um dos picos de massa humana no primeiro palco principal.

A noite caminhava para o fim com Deathchant que acumulava a tensão dos seguidores mais energéticos que se libertaram, por fim, no indescritível espetáculo de Dame Area, uma entrega electrónica que muitos festivaleiros estranharam mas que sem dúvida foi um zénite noturno, elevado por esta dupla radicada em Barcelona que terá uma aparição no festival Les Siestes Electroniques na Casa das Artes Bissaya Barreto.

Fotografia de Iago Alonso do concerto de OFF!

Dia 11

A secção campista da RUC e amigos acordava mais uma vez para dar início aos preparativos para a cobertura do evento. Começava um dia repartido entre mergulhos no mar nortenho, paragens no tórrido recinto chamuscado por WeedPecker, Monarch e Naxatras e uma visita a Vila Praia de Âncora para perpetuar o consumo de hambúrgueres de espadarte. Durante toda a travessia os barcelenses Black Bombaim e os suecos Greenleaf foram entrevistados pela equipa de Coimbra. 

O final desta tarde culminava com peso no Palco 2: Mondo Generator, a banda de Nick Oliveri, músico que participou em Kyuss, grupo frequentemente associado ao pioneirismo do rock do deserto, do qual interpretaram nessa tarde o tema “Green Machine”. O seu concerto terminava com o tema “You Think I Ain’t Worth a Dollar, But I Feel Like a Millionaire”, de uma das bandas anteriores de Oliveri, Queens of the Stone Age. Toda a energia seria transfigurada, sem perder o seu ritmo, por Bombino, outra aposta vinda de Agadez, no Níger.

Um nome emergente de Santa Cruz na Califórnia, Scowl, trouxe um concerto icónico, dedicado “a todos que sentem que não pertencem”, um presente de Hardcore Punk não conformista que passava por um cover da “99 Luftballoons” e as palavras “thank you, scum” como agradecimento.

O palco principal seria para o génio sónico de Thurston Moore Group, projeto encabeçado pelo fundador de Sonic Youth que fazia uma ponte perfeita de pedais de distorção para Frankie and the Witch Fingers que terminaram com o hino dos The Stooges, “I Wanna Be Your Dog”. Por essa altura as ligações eléctricas fizeram curto circuito com um público que teve de passar pela terapia imersiva de Elder, calibrando a atenção dos festivaleiros portugueses para Black Bombain. Uma banda que só recentemente voltou a pisar os palcos nacionais e que neste Sonic Blast recebeu um apoio caloroso da comunidade. Bernardo Matos convidou os mesmos para o seu repertório de entrevistas de bandas ibéricas.

A noite terminava já a derreter com os helénicos Acid Mammoth no Palco 3 e toda esta oferta teve de ser processada num refúgio de tendas, em conversa sobre o que se tinha acabado de experienciar.

 

Fotografia de Iago Alonso do concerto de Scowl

Dia 12

O último dia do festival pedia os disparos dos cartuchos finais, entenda-se, de arma semi automática. A entrada no último túnel era liderada por contingentes em trio: os noruegueses Kanaan, os italianos Black Rainbows e a brigada californiana, Earthless. 

O auge na experimentação ao vivo chegou com A Place to Bury Strangers, grupo de noise rock de New York, que tocaram a certa parte, no meio do público até terem só metade dos seus instrumentos. A sujidade, o feedback e toda a terra colada à pele só podiam levar a Eyehategod, icónico grupo de sludge metal de New Orleans, que durante uma hora triturou num circlepit alguns temas de álbuns como “Take As Needed For Pain” e “Confederacy of Ruined States”. Jimmy Bower e Mike IX, veteranos da podridão e do arrasto, foram o combustível de um público que pedia para ultrapassar limites que a este ponto eram meros conceitos na abstração humana. 

Fotografia de Iago Alonso do concerto de A Place To Bury Strangers

 

Foi com os argelinos Imarhan que o festival permitiu a mudança justa de públicos e a troca de turnos para repousar os corpos. O sol já posto permitiu a entrada real no psicadelismo com The Black Angels, que com um arsenal de guitarras e baixos e uma projeção de visuais hipnóticos, lançava para lá das estrelas os olhos fixos de quem tinha sido capturado pelo véu desta banda texana.

A este ponto quem não tinha tampões para os ouvidos podia só tentar aguentar-se de pé no concerto dos japoneses Church of Misery. O seu doom metal e as letras sobre homicídios em massa agregaram toda uma missa de seguidores desta banda que conta com um potente apoio internacional.

 No mesmo registo de densidade instrumental e crowd surfing, estreavam em território português, Dozer, que apesar de alguns elementos da sua formação terem tocado no dia anterior em Greenleaf, continuava a ser novidade esperada a sua presença. Uma autêntica parede de stoner rock e uma jóia na coroa dos festivais portugueses.

 Restavam mais três concertos até ao final da noite, um segmento que terá de ser descrito da melhor forma apesar da variedade de sensações que o espetáculo de banda injeta no sistema nervoso humano. A praia ficou assombrada por Lunavieja, que na Andaluzia aprenderam a manusear as ambiências de ritualismo e de bruxedo, um concerto marcado pela performance cativante, pelas máquinas de fumo e guturais profundos, acabava com as seguintes palavras: “Never forget this night, never forget who you are and never, ever, forget Lunavieja”.

 Seria no Palco 3 que El Altar Del Holocausto iniciava o segmento final, o seu post-rock com toques de doom metal e uma estética bíblica transportava o som em grandes ondas de vermelho, chegando a pontos no concerto que levavam ao moshpit, a banda espanhola terminou a cerimónia com as suas vestes brancas e subiam ao palco os americanos Lovegang… Os primeiros quinze minutos do seu concerto trouxeram uma energia clássica, descrita por algumas pessoas no público como análoga a Motorhead, considerações que não tiveram muito tempo para serem analisadas pois estalava o moshpit mais energético destes dias todos, os corpos voavam pela poeira que se levantava do chão e o registo de diversão, por vezes acompanhado de uma flauta transversal, foi o estado de espírito do concerto de encerramento. 

 No momento de saída do recinto, na banca do Âncora Praia FC, cantava-se de megafone o hino do clube, e é na população da vila que encontrámos o bónus do Sonic Blast 2023. A Rádio Universidade de Coimbra deixa os seus sinceros agradecimentos ao Henrique Dantas, ao José Corbina e à restante equipa do Âncora Praia Futebol Clube pela sua hospitalidade e amabilidade, deixando votos de uma reunião na próxima edição que tem já as datas marcadas de 8 a 10 de agosto de 2024.

O nascer do dia foi testemunha da nossa equipa letárgica deitada entre as demais tendas do parque de campismo, em conversas longas e intangíveis mas com um desejo em comum: voltar a reencontrar um espírito avassalado pela potência da música ao vivo.

Fotografia de Iago Alonso do concerto de Lunavieja

Fotografia de Iago Alonso do concerto de El Altar del Holocausto

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