Concerto Arnaldo Antunes + Vítor Araújo no Convento de S. Francisco em Coimbra a 19 Junho
Um concerto que foi mais que isso…Foi uma viagem pela poesia, pela música, pelo amor, pela liberdade de pensamento e crítica social tão importante na arte e nas nossas vidas. A apresentação do novo álbum “Lágrimas no Mar” de Arnaldo Antunes e Vítor Araújo teve direito a passar pela cidade de Coimbra, no passado dia […]
Um concerto que foi mais que isso…Foi uma viagem pela poesia, pela música, pelo amor, pela liberdade de pensamento e crítica social tão importante na arte e nas nossas vidas.
A apresentação do novo álbum “Lágrimas no Mar” de Arnaldo Antunes e Vítor Araújo teve direito a passar pela cidade de Coimbra, no passado dia 19 de Junho às 18h, no local perfeito – na Capela Antiga do Convento de S. Francisco. As outras datas da digressão em Portugal foram Serpa no XIX Encontro de Culturas a 18 de Junho e a 20 de Junho em Lisboa no Teatro Maria Matos.
A Rádio Universidade de Coimbra teve o privilégio de conversar com os músicos, uns dias antes da sua apresentação ao vivo, a convite do programa “Malandragem Ó Malandragem”, que se realiza às segundas às 12h. A entrevista complementa a compreensão do espectáculo idealizado por Arnaldo Antunes e Vítor Araújo.
Mesmo estando a aproximar-se o verão, o dia estava um pouco chuvoso, mas a tarde veio-se a mostrar soalheira e a convidar para um fino no Café-Concerto do Convento de S. Francisco, antes do concerto começar. O espaço foi ficando preenchido, com famílias, amigos e fãs de Arnaldo e do seu novo projecto com o pianista Vítor Araújo.
Antes das 18h, já a Capela se encontrava composta, acabando por encher com um público silencioso e expectante com o que estaria para acontecer.
Arnaldo Antunes
É uma voz inconfundível que transborda poesia! Desde o seu começo na banda d’ Os Titãs nos anos 80, passando pela sua carreira a solo, participando no grande sucesso d’Os Tribalistas ao lado de Marisa Monte e Carlinhos Brown e suas múltiplas parcerias com músicos como Toumani Diabaté, Edgar Scandura, Curumin, Jeneci e até com os lusos Clã.
Para além da sua música, as suas letras estão ligadas intrinsecamente à sua poesia concreta, tendo editado vários livros, o último “Algo Antigo” em 2021, pela Companhia das Letras.
Vítor Araújo
Vem do Recife e de uma geração mais nova. Aos 19 anos lança um álbum ao vivo, mostrando o génio e mestria ao piano com formação clássica do jazz mas também experimental, mostrando uma abertura fora do comum para todas as influências que encontre pelo caminho.
O seu último trabalho discográfico “Levaguiã Terê” de 2016 é uma peça a ouvir de trás para a frente, mas em breve terá novos projectos à espreita.
O concerto começa com “Manhãs de Love”, música escrita a 2 mãos com Erasmo Carlos em 2014, que foi reintegrada para este último trabalho discográfico. À 3ª música “Lágrimas no Mar”, Arnaldo Antunes agradece ao público de Coimbra e como já tinha saudades de Portugal, vindo mesmo a referir:
“Parece um sonho…!”
O concerto é intercalado com poemas do cantor mas, como Vítor Araújo disse na entrevista, esta é a parte que ele mais gosta, em que dão ainda mais emoção e intensidade ao concerto.
O Pensamento
“Por que é que eu penso agora
sem o meu consentimento?
Se tudo que comemora
tem o seu impedimento,
se tudo aquilo que chora
cresce com o seu fermento;
pensamento, dê o fora,
saia do meu pensamento.
Pensamento, vá embora,
desapareça no vento.
E não jogarei sementes
em cima do seu cimento.”
Para além da voz de Arnaldo que se entranha em cada veia do nosso corpo e a delicadeza ou a violência de Vítor ao piano, afundando-se dentro dele e rejubilando com a cabeça e os pés, temos a encenação por trás com vídeos que acrescentam uma rara beleza e fazem pasmar qualquer criança irrequieta.
Quando a canção “Socorro” toma lugar, assistimos a uma das poucas intervenções do público, em que Arnaldo pede que cantem com ele, uma das estrofes:
“Qualquer coisa que se sinta
Tem tantos sentimentos, deve ter algum que sirva”
Chega então a parte da explosão que Arnaldo nos falava na entrevista! Os temas “O Real Resiste” e o tão ansiado “O Pulso” trazem a intensidade na performance e na importância da palavra na voz de Arnaldo Antunes e o piano “desconstruídamente” belo de Vítor Araújo. É aqui que o público se manifesta de forma espontânea, na sua maioria brasileiros, gritando “Fora Bolsonaro” contudo, também o público português – que não fica indiferente ao que se passa no país irmão. No final, Arnaldo comenta:
“Esse pesadelo vai acabar!” Sendo, de seguida, aplaudido com furor.
Quase no final da actuação, assistimos a um momento de ternura com a entrada de Márcia Xavier – mulher de Arnaldo – dançando com o seu companheiro e partilhando 2 temas “Umbigo” e “Como 2 e 2”.
O CORPO
“O corpo existe e pode ser pego.
É suficientemente opaco para que se possa vê-lo.
Se ficar olhando anos você pode ver crescer o cabelo.
O corpo existe porque foi feito.
Por isso tem um buraco no meio.
O corpo existe, dado que exala cheiro.
E em cada extremidade existe um dedo.
O corpo se cortado espirra um líquido vermelho.
O corpo tem alguém como recheio.”
Quase 2h de concerto onde ninguém ficou indiferente ao valor artístico e à intensidade dada nesta “viagem”! Experienciou-se um misto de sentimentos, entre o amor, a ternura mas também a revolta e uma boa dose de rebeldia, que se manifestou no piano de Vítor Araújo e na atitude punk que subsiste no Arnaldo desde os seus tempos de Titãs.
Foi um momento de pura felicidade poética, em especial para um fã que veio do Algarve para assistir ao concerto e obter uma foto com o seu cantor favorito!
Mas eu também saí de lá feliz!!
“O pulso ainda pulsa…!”
Alinhamento do concerto:
1. Manhãs de Love
Poema: A Boca Oca
2. João
3. Lágrimas no Mar
4. Fim de Festa
Poema: O Buraco do Espelho
5. Socorro
Poema: Bacanas
6. O Real Resiste
Poema: Saga
7. O Pulso
8. Vilarejo
Poema: No Fundo
9. Lua Vermelha
Poema: Saudades
10. Enquanto Passa Outro Verão
11. Contato Imediato
Poema: Um Deus
12. Na Barriga do Vento
Poema: Pensamento
13. Fora da Memória
14. Umbigo
15. Como 2 e 2
16. Meu Coração
Poema: O Corpo
17. Saia de Mim
18. Encore: Alta Noite
Fotos: Augusto Fernandes
Deixamos aqui a entrevista completa no link abaixo: