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12.02.2022POR Rita Brás

Luca Argel celebra 36º aniversário da RUC com concerto no TAGV

A Rádio Universidade de Coimbra celebra 36 anos com um concerto de Luca Argel no Teatro Académico de Gil Vicente.

 

 

“36 anos é dose!” é o mote do aniversário que a Rádio Universidade de Coimbra (RUC) festeja este ano. A pretexto dessas celebrações, Luca Argel sobe ao palco do Teatro Académico de Gil Vicente (TAGV), no dia 4 de Março, pelas 21h30, para apresentar o seu mais recente trabalho, “Samba de Guerrilha”.

 

Rita Brás esteve à conversa com Luca Argel para saber mais sobre ‘Samba de Guerrilha’, conhecer a trajetória do artista e compositor brasileiro e descobrir o que podemos esperar da apresentação no âmbito do 36º Aniversário da RUC. Em entrevista, Luca Argel explica o caminho que ‘Samba de Guerrilha’ fez desde o projecto inicial que surge a pretexto de um convite da já extinta associação ContraBANDO, no Porto, até ao formato final que hoje conhecemos, lançado em 2021. Uma conversa/concerto sobre a história do samba, muita investigação, um jornal ilustrado, muitas histórias, vozes e sambas e eis o resultado: um objecto didático onde Luca apresenta as histórias mais emblemáticas da (longa) vida do samba.

‘Samba de Guerrilha’ abre com a história de Alfredo Português e essa escolha é expressiva da vontade de Luca falar ao público de Portugal, com a escolha e valorização de histórias que criam uma ligação estreita com os ouvintes portugueses. É também assim que ficamos a saber que 13 de Maio é uma data importante para ambos os países, por razões totalmente diferentes. Como nos conta em ‘Samba de Guerrilha’, a 13 de Maio de 1917, em Portugal, três pastorinhos avistavam Nossa Senhora de Fátima na Cova de Iria. No Brasil,  no mesmo dia mas 29 anos antes, a escravatura era oficialmente abolida. Os elementos dos patrimónios dos dois países vão sendo cruzados ao longo do álbum, mostrando como resultam de imaginários que, embora significativamente partilhados, contrastam entre si.

Percorrendo os sinuosos trilhos do samba, Rio de Janeiro, a cidade de Luca Argel, é paragem obrigatória. É no Rio que nascem os primeiros sambistas, na saudosa Praça Onze, como resultado do caldeirão cultural que ali emergiu depois da abolição oficial da escravatura. A origem do samba, o processo de higienização social de cidade, a destruição da Praça Onze e de outros espaços de convivência de milhares de pessoas recém libertadas da escravidão, a perseguição da presença e da cultura negra: são algumas das histórias duras e violentas que Luca Argel nos conta e canta com tanta doçura em faixas como ‘Direito de Sambar’, ‘Praça Onze’ e ‘Agoniza mas não morre’.

Olhando para o Rio de Janeiro dos dias de hoje, Luca explica-nos como é que esses elementos de desigualdade e descriminação – presentes na cidade desde sempre – ali persistem e, atualmente, se impõem à sociedade de uma forma muito violenta. Na opinião do artista – fazendo uso da expressão de Luiz Antônio Simas, historiador brasileiro –, “o problema do Brasil não é estar a dar errado, o problema do Brasil é que está dando certo!” O projecto colonial continua a funcionar, a descriminação, o racismo e o machismo ‘continuam dando certo’. Percebemos que é por isso que o samba, quando surge, é muito perseguido, porque constitui-se como uma ameaça à lógica colonial, que está na origem do Brasil e persiste até aos dias de hoje.

No entanto, não se pode dizer que o samba seja apenas ou propriamente um ponto de resistência ao sistema. Como nos explica Luca Argel, o samba não depende nem é pautado por esse sistema. Tem um identidade própria e é muito mais do que uma resposta ou um mecanismo de resistência: “o samba não resiste, o samba cria!” Por isso, existe em primeiro lugar para as comunidades, onde cria relações de solidariedade e coesão social e fornece protecção e segurança social. O samba constitui-se, assim, como uma forma de vida, mais humana, que propõe viver para cantar, para dançar para… viver!

É sobre essa forma de cantar e viver que ‘Samba de Guerrilha’ se desenvolve, uma história com mais de 350 anos de sofrimento, de perseguição física e cultural. ‘Samba de Guerrilha’ dá a conhecer as formas de conhecimento, cultura e arte que estão na base dessa história. São outras formas de compreensão e de leitura do mundo, criadas pela diáspora e pela cultura negra, que resultam de uma herança africana, mas condenadas e apagadas pela cultura ocidental até aos dias de hoje. É essa relação complexa e reactiva que o ocidente e Portugal têm com o passado colonial que Luca Argel desafia no seu último trabalho.

E é também essa mentalidade e identidade colectiva que o artista discute à conversa com Rita Brás, numa entrevista que termina com a partilha do que Luca deseja para ‘Samba de Guerrilha’ no futuro: um projecto autónomo da sua carreira, que se vai desenvolvendo progressivamente para outros formatos. Talvez um dia ‘Samba de Guerrilha’ continue sem o Luca, ou melhor, sempre com o Luca, mas além dele.

Para a apresentação em Coimbra, Luca Argel promete um concerto com uma carga emocional muito especial, já que em palco celebram-se dois aniversários: 36 anos de Rádio Universidade de Coimbra e 1 ano de ‘Samba de Guerrilha’. Efemérides, renovação de ciclos e clima de carnaval, só óptimos pretextos para marcar presença no dia 4 de Março, às 21h30, no TAGV.

A entrevista completa pode ser escutada aqui e os bilhetes podem ser adquiridos na bilheteira do TAGV e no site da BOL.

Este concerto realiza-se no âmbito da XXIV Semana Cultural da Universidade de Coimbra e conta com o apoio do Hotel Botânico de Coimbra.

 

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