Protocolo com APBRA200 sobre Casa da Escrita divide vereação da Câmara de Coimbra
CDU e PS votaram contra. Foi necessário exercer voto de qualidade para a proposta de protocolo ser aprovada. Presidente da Câmara delegou no vice-presidente a condução dos trabalhos neste ponto da agenda.
A Casa da Escrita, morada de João José Cochofel por onde passou o neorrealismo português, vai passar a ser designada por Casa da Cidadania da Língua, aprovada que está a cocuradoria, entre o Município de Coimbra e a Associação Portugal Brasil 200 anos (APBRA200).
Presidente da Câmara Municipal de Coimbra (CMC), José Manuel Silva, não participou no debate, nem na votação desse ponto da agenda, na sessão de Câmara, ontem, segunda-feira, dia 2 de outubro.
O autarca delegou a tarefa no vice-presidente, Francisco Veiga. A Assembleia Geral da APBRA200 é presidida por um dos irmãos do autarca, João Gabriel Silva, ex-reitor da Universidade de Coimbra, agora à frente do Instituto Pedro Nunes.
Do orçamento municipal de 2024 e 2025 vai constar o valor global de 150 mil euros para a concretização da programação da Casa da Cidadania da Língua, 75 mil euros em cada ano.
Antes de sair da sala das sessões, José Manuel Silva esclareceu que a Câmara de Coimbra não vai transferir verbas diretamente para a Associação Portugal Brasil 200 anos, mas vai financiar “a atividade cultural” e será também a Câmara a “desenvolver todos os procedimentos”.
A designação da Casa da Escrita, a partir do dia 12 de outubro de 2023, durante o período de vigência do protocolo estabelecido em 24 meses, vai passar a ser Casa da Cidadania da Língua.
Francisco Queirós, vereador eleito pela Coligação Democrática Unitária (CDU), lamentou o que considerou ser, “o profundo desrespeito pelo poder autárquico democraticamente eleito” e lembrou que a vereação foi convidada para a (re)inauguração da Casa antes de o protocolo ser discutido e aprovado em sessão de Câmara.
“Servirá de residência de criadores, será um ponto de encontro entre o público e escritores, terá uma biblioteca, locais de escrita e de leitura, entre os quais um jardim de acesso livre” – jornal Público
A Casa da Escrita foi inaugurada em novembro de 2010, era então presidente de Câmara Carlos Encarnação, eleito pelo PSD, partido que faz parte da coligação que agora governa a Câmara de Coimbra. Nesse mês o jornal Público publicou um artigo onde o jornalista André Jegundo escreveu sobre o que seria a missão da Casa da Escrita.
Outra das razões do voto contra do vereador da CDU tem a ver com o facto do protocolo ir mais além da alteração do nome e alterar “por completo a missão inicialmente definida”.
“Quais as razões pelas quais o sr. Presidente não subscreve o Protocolo? Conflito de interesses do Presidente? Ética republicana? Ou monárquica?” – Hernâni Caniço (PS)
Coube ao vereador Hernâni Caniço defender os quatro votos contra do Partido Socialista (PS). Na declaração de voto da bancada são enumeradas várias razões para a não aprovação do protocolo com a APBRA200.
Entre elas, a associação ter “sede em Lisboa” e ter sido constituída menos de um mês depois de a coligação Juntos Somos Coimbra, presidida por José Manuel Silva, ter tomado posse.
“ …tem por finalidade apoiar e desenvolver ações para a defesa, elevação e manutenção da qualidade de vida do ser humano e do meio ambiente, através das atividades de pesquisa, divulgação e cooperação; cultural, educacional, profissional e ambiental, não só em Portugal, como no Brasil ou em qualquer outro território.” – artigo terceiro dos Estatutos da APBRA200
Os socialistas também não vislumbraram ações já desenvolvidas que os levem a confiar que no futuro serão concretizadas as intenções definidas no artigo terceiro dos estatutos da APBRA200.
O vice-presidente, Francisco Veiga afirmou “estar confortável” em ter de assinar o protocolo e ficar responsável por ele durante 24 meses. Procurou tranquilizar a oposição acrescentando que o presidente da Câmara “não vai autorizar qualquer despesa no âmbito deste protocolo”.
Francisco Veiga acredita que “a haver uma Casa da Cidadania da Língua Portuguesa na cidade de Coimbra tem de extravasar a Casa da Escrita” e admitiu que o protocolo é “o lançamento de uma semente para algo com uma dimensão muito maior”.
À RUC, o vice-presidente da Câmara deCoimbra confirmou que não vê no protocolo “nenhum drama” uma vez que pode ser denunciado caso não seja cumprido o que está estabelecido no protocolo de parceria.
Lembramos que o atual executivo dispensou da curadoria da Casa da Escrita o poeta e deputado municipal, António Vilhena, nomeado pelo anterior governo autárquico socialista. O primeiro curador da Casa da Escrita foi o professor da Universidade de Coimbra, José Seabra Pereira.
Com a celebração do protocolo com a APBRA200, José Manuel Diogo, presidente da associação e também diretor da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Brasileira vai exercer cocuradoria da agora Casa da Cidadania da Língua com a Câmara Municipal.
José Manuel Diogo nasceu em 1966 em Castelo Branco, é licenciado em Jornalismo pela Universidade de Coimbra. Tem trabalhado na área da Comunicação Corporativa em empresas privadas e no setor público. Publicou em 2018 o livro “As Grandes Agências Secretas” onde escreveu sobre a evolução dos serviços de informação.
Pode saber mais sobre o debate ouvindo o ‘podcast’ do início do artigo.
Fotografia: CMC