Radio Baldia
Que não é vista como cultivável, por cultivar, usada colectivamente. Ruína de espectros passados, o lugar da arquitetura transitória, espaço especulativo. Entre a desmaterialização do som e a materialização das formas de resistência, abrem-se brechas sonoras para existências constrangidas na paisagem mediática. Baldia é rádio de possíveis, ruído nas conversas etéreas do oceano da informação.
Guiou este programa a ideia de rastro. D’algo que passa e deixa parte de si, como o grafite ou carvão, o betão e os pés da terra. Se o baldio existe na tensão entre o passado e o futuro, o rastro é o que os transpõe, que possui algo de performativo e informativo para os rumos que se seguem. Um rastro pode ser então um elemento operativo para a educação, como um testemunho de políticas passadas, vivências e herança. Algo que permite, dentro do paradigma da verdade liminar, reagir aos mecanismos de desinformação que culminam na contínua intensificação da infosfera e precarização do território, um tempo em que “nossas máquinas se tornam perturbadoramente vivas, e nós próprios assustadoramente inertes”(Haraway, 1985).
A componente sonora que ouvem é uma composição original que utiliza a sonificação de uma imagem digital tambem composta para esse programa. Pelos 55 minutos percorremos transversalmente as extremidades destes 4.523.420 pixeis, ou 450,560 binários, e revelamos o espectrograma de uma ambiência pesada e meditativa. A tentativa, então, de expandir esta imagem a um espaço auditório, serve para reiterar que toda a informação não basta, a não ser que ela deixe seu rastro, que algo permaneça destes pontos de luz. Buscamos formas de produção que se oponham à instantaneidade da imagem digital, e que se atentem às formas de suspensão no tempo, de uma impressão perene dos meios de existência que contrariam o incessante “à seguir” cartesiano do scroll ou os áudios às “2X”.
Programa de Gaspar Cohen.