AUTOR: Mariana Caparica

DATA: 16.04.2025

DURAÇÃO: ...

Já muito se falou e discutiu sobre o potencial novo mundo que a guerra comercial iniciada por Donald Trump pode formar. Analisa-se e tenta-se solucionar este enorme puzzle que o presidente norte-americano atirou inesperadamente para o chão. As ameaças tarifárias misturaram as peças, destruíram os cantos e baralharam as cores.

A perturbação económica envolve a procura de novos amigos com quem possamos voltar a formar a figura, sem correr o risco de destruição da organização prévia.

A União Europeia guia-se pela livre circulação comercial, e é o segundo maior exportador mundial de bens e serviços. No primeiro lugar do pódio – com um crescimento significativo impulsionado por investimentos em manufatura e tecnologia – está a China. O terceiro lugar é ocupado pelos Estados Unidos.

Para a União Europeia, estar sujeita à taxa de base de 10% sob as exportações, com o aço, o alumínio e os automóveis sujeitos a uma taxa punitiva de 25%, é um pontapé na ideologia libertária que a orienta. Poderia divagar sobre o historial de ameaças tarifárias com que Donald Trump entretém o mundo diariamente. Porém, sendo esta rubrica quinzenal, quinze dias é tempo mais do que suficiente para que qualquer análise seja ultrapassada pela próxima excentricidade geopolítica.

Por isso, em vez de descodificar percentagens, vamos ao que desencadearam.

Na terça-feira de 8 de abril, Úrsula von der Leyen ligou ao primeiro-ministro chinês Li Quian. A China é populada por uma vasta classe média com capacidade de comprar produtos estrangeiros. O objetivo de Bruxelas seria convencer este parceiro comercial avantajado a investir em produtos e serviços europeus.

Após a conversa entre von der Leyen e Quian, foram publicados dois comunicados otimistas.

Um pela Comissão Europeia.

“Em resposta à perturbação generalizada causada pelos direitos aduaneiros dos EUA, a Presidente von der Leyen sublinhou a responsabilidade da Europa e da China, enquanto dois dos maiores mercados mundiais, em apoiar um sistema comercial reformado, livre, justo e assente em condições equitativas.”

Seguiu-se Pequim, com:

“A China e a UE são os parceiros comerciais mais importantes um do outro, e as suas economias são altamente complementares e os interesses estão estreitamente interligados.”

Uma amizade que se pareceu consolidar com o pé direito.

Pedro Sanchéz, primeiro-ministro espanhol, foi à China picar o ponto da aliança e dotou a comunicação social de declarações sobre a necessidade de companheirismo com Pequim.

E numa jogada de materialização do compromisso, na sexta-feira de 11 de abril, Bruxelas e Pequim concordaram em reavaliar a opção de “compromissos de preços” de maneira a resolver o conflito sobre os veículos elétricos fabricados na China. Acontece que em outubro de 2024, a União Europeia impôs tarifas que chegaram a atingir 45,3% para alguns fabricantes chineses. A reavaliação visa substituir as taxas por um sistema de preços mínimos a acordar.

Mas nem tudo são rosas neste recém companheirismo.

Num improvável entrelaçar de enredos, Volodymyr Zelensky surgiu para lembrar a União Europeia da postura duvidosa da China em relação à guerra em solo europeu. O governo ucraniano afirmou que cidadãos chineses são recrutados para combater ao lado da Rússia, acusação que Pequim desmentiu. A bem da verdade, desde fevereiro de 2022, a União Europeia tem vindo a mostrar-se relutante com a posição da China em relação à invasão da Ucrânia. Pequim, em várias situações, refere-se ao conflito como “crise” e é inegável a parceria que Xi Jiping, presidente chinês, mantém com Vladimir Putin.

A título de exemplo: Xi Jinping vai marcar presença em Moscovo nas comemorações do octogésimo aniversário da vitória sobre o nazismo, no próximo dia 9 de maio. Em contraste, recusou o convite para participar na cimeira que vai assinalar o quinquagésimo aniversário das relações diplomáticas entre a China e a União Europeia, prevista para julho de 2025 em Bruxelas. Quem o vai substituir será o Primeiro-Ministro chinês, Li Qiang.

Existe uma lista de fricções europeias em relação à China. Não só económicas – como a exportação maciça de produtos de baixo custo fabricados na China, a forte utilização de subsídios estatais em detrimento de concorrentes estrangeiros, regulamentos protecionistas que impedem o acesso europeu ao mercado chinês – como ideológicos.

O regime social chinês em muito difere do europeu. O controlo dos cidadãos e empresas privadas, o comportamento agressivo no Estreito de Taiwan, a repressão da minoria uigur na região de Xinjiang, as violações dos direitos humanos, ciberataques e campanhas de desinformação – tudo questões que deixam os europeus de pé atrás.

Posto isto, estará a União Europeia perante um cenário em que tem que fazer vista grossa a estas diferenças ideológicas, de forma a enfrentar o problema económico comum?

A maior parte dos 27 estados-membros da União Europeia ainda não se pronunciou sobre o novo aliado.

A atenuar este impasse, veio Alicja Bachulska, membro do Conselho Europeu de Relações Externas afirmar que “as atuais conversações comerciais com a China não têm necessariamente a ver com uma maior aproximação a Pequim, mas sim com a utilização deste momento estratégico de incerteza para negociar novas condições e um novo quadro para o compromisso”.

Fotografia: 25/06/2018REUTERS/Jason Lee