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Luna Fest 2024 – Energia, Magia, Rock e Emoção

De 6 a 8 de setembro a segunda edição do Luna Fest

 

Programa de rescaldo do Luna Fest 2024

 

entrevista Deadletter conduzida por Pedro Nora

entrevista The Parkinsons conduzida por Pedro Nora

 

1º dia – 6 de setembro

Os Carrion Kids abriram o festival com indumentárias tão irreverentes como a sua música, com energia contagiante a angariar um público crescente. Ocasionais goles de tequila foram servindo enquanto combustível para o quinteto mexicano, cuja boa disposição fez esquecer que o concerto decorria uma hora mais tarde que o previsto. Seguiram-se os The Twist Connection, a autodenominada banda local do primeiro dia do Luna Fest que agarraram o público congregado com uma demonstração tão energética quão calorosa. Ao invés da melodia, o essencial do rock acaba sempre por ser a paixão e o trio liderado por Carlos Mendes (“Kaló” para os amigos) exibiu um fulgor empático com o público que respondeu em igual medida. Entre desejos de longa-vida ao Luna Fest e tendo como convidado o lendário Boz Boorer, o concerto encerrou com a cover de «Heyday» (original de Adrian Barlow) lançada ela banda conimbricense em 2019. Também em palco apareceu Sérgio Cardoso, o baixista da banda, para uma saudação, ele que tem sido, substituído por Pedro Chau nos últimos concertos.
Após a invocação musical dos The Sound, o palco voltou à vida após uma pausa algo extensa (uma preocupação crescente por entre a plateia no Parque da Canção, que ponderavam a que horas terminaria o primeiro dia do festival) para receber os Theatre of Hate. Liderados por Kirk Brandon, a presença da banda era algo aguardada, como o próprio vocalista acabou por frisar ao pedir desculpa por demorarem tantas décadas a voltarem a pisar um palco português. O concerto centrou-se no mítico álbum de estreia do colectivo «Westworld», recentemente
regravado pela banda para assinalar o seu 40º aniversário. Por entre temas como Conquistador», «The Wake» e «Do You Believe in the Westworld?» (que encerrou o concerto), houve igualmente oportunidade para os britânicos revisitarem o projecto paralelo Spear of Destiny com «Grapes of Wrath», num espectáculo onde o evidente destaque
instrumental vai para o saxofonista John “Boy” Lennard.


À banda de culto seguiu-se uma figura já mítica: Lene Lovich. Apesar do seu estatuto incutir em aplausos desenfreados nos acordes iniciais de «What will I do without you», a cantora norte-americana mostrou-se muito afável e acessível, abordando constantemente o público de Coimbra com simpatia recíproca. Por entre esses episódios de cumplicidade, houve muitos números musicais como «Blue Hotel», «Supernature» (versão do êxito das pistas de dança originado pelos Cerrone) e, claro, «Lucky Number». Embora o vigor da cantora fosse incandescente ao ponto de iluminar uma noite gélida que já obrigava muitos a agasalharem-se em camadas de roupas (seguindo o exemplo do vestuário da artista em palco), a qualidade técnica do som e dos visuais deixava no ar algumas preocupações no público presente no recinto do festival.
Uma crítica que foi abordada oportunamente com a presença de The Legendary Tigerman, que demonstrou ser um festim audiovisual. Paulo Furtado regressou à cidade dos estudantes, entrando em palco após uma exibição da curta Nowhere (cine-poema que conta com a participação de Jenny Beth dos Savages) e envergando um poderio de palco animalesco. Por entre vertentes mais electrónicas derivadas do seu disco mais recente, não faltaram os clássicos de blues e rock que alicerçaram o outrora projecto one-man-band, entretanto transformado em colectivo: «Bright Lights, Big City», «Naked Blues» e «The Saddest Thing to Say» não mostraram quaisquer rugas de idade e os riffs do «21st Century Rock ‘n’ Roll» encerraram este fogo de artifício gutural que já havia reconquistado o público do Luna Fest, que entretanto havia alcançado os milhares de espectadores.


Congregados em torno do palco para ver os The Psychedelic Furs, o entusiasmo fazia-se sentir no ar frio à margem do rio Mondego. O concerto da banda dos irmãos Butler iniciou-se como sequência do rock do século XXI, revisando a origem do género musical no tom fabular de «The Boy That Invented Rock & Roll», faixa que abre o mais recente trabalho de estúdio da lendária banda, editado de surpresa no ano pandémico de 2020. No entanto, por diversas
vezes a meio desse tema e de «So Run Down» o som do palco foi inexplicavelmente falhando, para grande frustração dos presentes. Nem a cantoria do público a acompanhar «The Ghost of You» conseguiu vencer a frustração técnica e, a meio desse tema, a banda recebeu instruções de abandonar o palco por parte do manager, deixando a plateia de Coimbra completamente destroçada.
Igualmente desiludido com todo o sucedido foi Vítor Torpedo, que pouco depois tomou o palco para tentar explicar a situação aos presentes e impelindo a progressão do festival para o concerto seguinte, que esteve a cargo dos M’As Foice. O mítico colectivo musical de Coimbra esforçou-se para atingir o impossível e entreter os resistentes que não tinham abandonado o recinto, quer pelo abandono dos The Psychedelic Furs, quer pelo frio extremo que se fazia sentir. Sem um dos seus fundadores, Sérgio Cardoso, todos os elementos que nos habituamos a ver em palco estiveram presentes. Apesar de um som algo baralhado, brindaram o povo com alguns clássicos, misturados com muita farinha e papel higiénico. Fardados a rigor, este acabou por ser uma reunião que se vai recordar com agrado. O concerto foi interrompido às 4h00 por imperativos de licença.

2º dia – 7 de setembro

O segundo dia do festival abriu com o trio conimbricense Birds Are Indie, com uma actuação pop bem conseguida e em jeito familiar, quer pelo à vontade do trio em palco quer pela reduzida quantidade de público que ao longo do dia foi manifestando alguma preocupação com o som derivada dos problemas que se fizeram sentir no primeiro dia. Aos poucos foi crescendo e foi com «So Many Ways», tema do último álbum editado em 2023, «Ones & Zer0s», que o trio convidou o público a dançar. Ainda houve tempo para movimentos de ginástica aeróbica de Ricardo Jerónimo sobre o olhar atento de Joana Corker e Henrique Toscano e a apresentação de um novo tema intitulado Not Today.
Num segundo dia que se mostrou ligeiramente mais parco em termos de público (pelo menos, em comparação com o dia anterior), seguiram-se os Johnny Throttle que arrebataram o palco  da Praça da Canção com o seu rock fulminante. Embora os ecos de frustração técnica da noite passada ainda se fizessem sentir por entre os rasgos de euforia energética do supergrupo londrino, o punk rock sem rodeios rapidamente retomava a atenção do público. Encabeçados pelo português Afonso Pinto, que conquistou a ribalta ao impressionar pessoas de todos os feitios e idades com devaneios jocosos que iam pontuando um alinhamento maioritariamente assente no disco homónimo da banda lançado em 2011, mas com algumas surpresas como o lado-B «Atomic Reaction».

As dúvidas sobre as falhas técnicas dissiparam-se com o concerto seguinte, a cargo de Selma Uamusse. À semelhança dos Dissidenten no ano passado, tratava-se do projecto mais inusitado por entre um vasto catálogo de bandas rock, mas a prestação da cantora foi um evento estrondoso que, só pela empatia calorosa, automaticamente entrou para o top de concertos do festival. Uamusse apresentou-se de forma franca, alternando entre os léxicos do português, inglês e moçambicano (ensinando inclusive termos como “kanimambo” ou “sekeleka”), mas com a música de ritmos tão calorosos quão dançáveis a quebrar as barreiras de comunicação e do palco, com a artista a descer à plateia e, pouco depois, a convidar as pessoas a juntarem-se à banda em palco para dançar e, sobretudo, celebrar. Uma apoteose que fica para a história do festival conimbricense.


Igualmente memorável foi o espectáculo proporcionado pelos Belle Chase Hotel. Não são todos? Como é costume, a banda de Coimbra subiu ao palco e, por entre composições magistrais e já imersas na cultura musical da cidade como «Keith Moon», «Paganini’s Fire» e – claro! – «Sunset Boulevard», houve uma boa disposição constante e contagiante, cujo ponto central equidistante (in)surgia na forma de JP Simões. Ou JP Camões, como ele jocosamente
chegou a renomear-se, em jeito de trocadilho. Entre estrofes e brindes, este trovador provou ser uma figura inimitável na música portuguesa, declamando sobre ideias tão inusitadas como s redes sociais serem nada mais que óbitos modernos ou a qualidade do vinho não destrona a felicidade. Concerto que se concluiu com uma vénia em grupo, mais que merecida perante o estrondoso aplauso de milhares que se tinham juntado para os ver. Contudo, igualmente expectantes eram os actos internacionais que se seguiriam aos Belle Chase Hotel.


Primeiro foi Kid Congo acompanhado dos The Pink Monkey Birds para apresentar o trabalho mais recente da banda com um concerto irrepreensível em musicalidade e energia. O disco intitula-se «That Delicious Vice» e mescla o rock pujante com as vertentes tropicais adjacentes à música latina, como se evidenciou com os temas «Silver for My Sister» ou «Ese vicio delicioso», este último cantado em coro com o público e cujo refrão viciante ficou na cabeça
de qualquer um presente nesta noite mais acalorada do Luna Fest. Kid Congo aproveitou bem a temática do Luna Fest, prestando homenagem às estrelas que a rodeiam em jeito de elogio fúnebre a antigos conhecidos como Sean DeLear dos Glue ou Jeffrey Lee Pierce do The Gun Club. E com efeito, não faltaram versões de «Goo Goo Muck» dos The Cramps e »Sex Beat» dos Gun Club, que levaram à euforia a plateia do Luna Fest.


Uma euforia que se reverberou no concerto seguinte, a cargo do cabeça-de-cartaz Jon Spencer. O norte-americano veio acompanhado de Kendall Wind e Macky Spider Bowman (a baixista e o baterista dos The Bobby Lees) para vir lançar o seu novo disco «Sick Of Being Sick», recheado de novidades como a vibrante “Disconnected”. No entanto, em cerca de 70 temas tocados durante hora e meia por via de medleys cinéticos, foi possível revisitar diversas  composições de projectos anteriores da vasta discografia do músico. Nomeadamente dos Blues Explosion, como foi o caso de «Bellbottoms» ou «Talk About the Blues». Jon Spencer foi um verdadeiro furacão que não deixou ninguém indiferente ou quieto, mas o baterista Bowman com os seus feitos impressionantes ocasionalmente ia roubando igualmente a ribalta no palco.

Para encerrar a segunda noite, surge o segundo nome algo inusitado a este festival de rock: Natty Bo, acompanhado dos The Top Cats, O londrino já se fazia notar no primeiro dia do festival, envergando vestimentas chamativas e, ao tomar o palco com o seu colectivo orientado para o reggae e ska, ainda foi conseguindo captar a atenção e movimentos dançáveis dos resquícios que o furacão Jon Spencer tinha deixado para trás.

3º dia – 8 de setembro

Chegado o último dia do festival, o mesmo começou quase a tempo e horas (para surpresa de muitos que já se haviam habituado aos atrasos dos dias anteriores) com concertos mais compactos mas nem por isso menos cativantes. É o caso dos So Dead, que foram enchendo o palco pouco a pouco com uma musicalidade transversal aos ritmos do pós-punk com as ambiências dos sintetizadores a sobressaírem. Em destaque esteve «Play Me Like A Doll», o novíssimo disco do duo conimbricense de Sofia Leonor e Samuel Nejati, acompanhados ao vivo pelo teclista Miguel Padilha, que já podemos quase considerar como terceiro So Dead.
Momentos pulsantes que reverberaram pela Praça da Canção, inaugurando a ronda final de concertos do Luna Fest deste ano que, infelizmente, ainda passaria por imprevistos técnicos que já se vislumbravam em breves falhas de som do palco neste primeiro concerto. Um empecilho que perdurou e manchou o concerto seguinte, a cargo dos franceses Weird Omen. A banda vinha preparada para um serão energético, almejando que a sua sonoridade trespassasse a curiosidade dos festivaleiros presentes. O que sucedeu foram variadas falhas de som de um dos lados do palco, o que dificultava o regozijo musical do espectáculo. Felizmente, os Club Makumba enfeitiçaram esses maus-olhares causados com uma demonstração ao vivo do seu disco mais recente, intitulado «Sulitânia Beat». Com uma invocação musical enraizada nos quatro cantos do mundo que se converge em sequências dançáveis, o quarteto formado por Tó Trips (na guitarra), João Doce (na bateria), Gonçalo Prazeres (no saxofone) e Gonçalo Leonardo (no baixo) voltou a retomar a fé no festival.
Fé essa ainda testada quando breves falhas técnicas no saxofone dos Deadletter tornaram-se notórias no início do concerto da banda britânica, prestes a lançar o seu longa-duração de estreia «Hysterical Strenght». Histeria seria um bom descritivo para as primeiras filas nesse concerto, onde todos os olhares estavam centrados na figura do vocalista Zac Lawrence que levou a plateia ao rubro tanto em declamações poéticas como em refrões orelhudos. Um espectáculo conciso mas potente, fazendo jus ao teor adrenal que a banda enverga em canções como «Mere Mortal», «Binge» ou «Zeitgeist» que fechou o concerto, convertendo muitos dos presentes em fãs acérrimos da banda e cimentando o vindouro renome dos Deadletter em listas e publicações musicais como o próximo grande fenómeno.


Já um fenómeno musical cuja energia ou irreverência dispensa quaisquer apresentações são os The Parkinsons, que voltam a pisar o palco do Luna Fest em substituição dos Mão Morta. Uma reserva que não deixou ninguém descontente, pois trata-se de um colectivo sempre fulminante. De facto, embora ao início tivesse faltado pedais na bateria, não faltou pedalada ao quarteto durante os sessenta minutos da performance, onde vigoraram temas
incontornáveis do punk contemporâneo como «Angel of the Night» ou «So Lonely», que esteve no epicentro de um dos maiores coros vocais de todo o festival.

 

Enchidas as medidas do punk com os concertos de Deadletter e The Parkinsons, o recinto do Luna Fest sofreu uma modesta redução de população, por ser domingo. No entanto, os fiéis permaneceram para testemunhar o regresso dos The Gories a Portugal. A banda de Detroit apresentou-se com o equipamento musical necessário às bases da sua sonoridade, que vagueia pelas fronteiras entre o garage, o blues e o punk. Depois disso, vieram os repetentes
La Élite fechar as hostilidades com palavrões em espanhol (apropriado, dado que o começo esteve a cargo dos mexicanos Carrion Kids) num concerto vigoroso que redobrou os passos de dança e a poeira em frente ao palco.
Após os concertos, o festival teve a oferenda final de um DJ set a cargo do projecto The Ema Thomas que durou até o Luna Fest fechar as portas por este ano.

Qual será o futuro? Ao anunciar os La Élite, Vítor Torpedo despediu-se com um “até para o ano”. Lá estaremos.

 

Texto de Pedro Nora, Nuno Videira, Nuno Ávila e Fausto da Silva

Fotos no meio do texto de Nuno Ávila

Foto de destaque e fotos da galeria abaixo de Fausto da Silva

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