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04.09.2023POR Gonçalo Pina

Jornada 5: Carta de amor a Chico Bala

Se todas as cartas de amor são ridículas, esta não é exceção. Francisco Ferreira veio para nos deixar enternecidos.

Sem discriminar em termos de lado de atuação, nos últimos dois anos vi jogar (ou não) laterais como Fábio Vianna, Nivaldo, Marco Grilo, Sualehe, Daniel Rodriguez ou Kalindi. No meu imaginário, a maioria destes nomes surge como uma mera anedota (umas com um final mais mórbido do que outras). Não são raras as vezes em que acordo com suores frios depois de um pesadelo em que vejo a bola entrar pelas costas de um destes nossos “defesas” para parar apenas quando bem acomodada no lençol de rede que deve ser protegido. Talvez por ter estado tanto tempo de flancos destapados me custe a acreditar que este ano é diferente, que há segurança e competência, mas há novos rostos que oferecem isso e muito mais em cada um dos lados – a edição de hoje é dedicada a Chico Bala.

Dono de uma careca reluzente, com uma largura de ombros invejável e portador de uma tatuagem em numeração romana que lhe preenche por completo o enorme bícep direito, o jogador nascido em Santa Maria da Feira era praticamente um desconhecido para a maioria dos adeptos da Briosa. Contando com apenas três temporada a sénior no currículo (uma no Campeonato de Portugal e duas na Liga 3), nunca tinha sequer defrontado a Académica e mesmo na formação não tinha chegado a alinhar num clube tão a sul do ponto de vista geográfico – foi assim, como um “Zé Ninguém”, que há poucos meses aterrou na lusa-Antenas.  O trajeto até ao coração dos academistas foi curtinho (talvez já conhecesse um atalho para chegar a um destino a que a maioria não tem acesso) e foi logo nos primeiros jogos que começou a dar nas vistas. Uma autêntica mota a correr junto à linha, capaz de bater qualquer adversário no corpo-a-corpo, ao longo dos primeiros jogos foi assistindo, ganhando pénaltis e, acima de tudo, encantando. O prémio MVP RUC chegou à quinta jornada, premiando um tiro de fora de área que faz jus à alcunha que lhe foi dada, garantindo três pontos em Alcochete.

Para já, só te consigo agradecer que te tenhas juntado a nós, Francisco. Sei que temos os nossos defeitos e que às vezes podemos não ser fantásticos, mas gosto muito de ti e acredito que podemos escrever uma história muito bonita juntos.

Chico foi ver o “Oppenheimer” e tirou notas

Quase que consigo imaginar Francisco Ferreira a sair do treino mais cedo. Abandonar o relvado, descalçar as chuteiras, tomar banho, arranjar-se, pegar no carro e almoçar qualquer coisa com medo de se atrasar. Desengane-se quem acredita que estou a tentar acusar o nosso Chico de algum tipo de desleixe profissional ou nutricional – nada disso! Acredito apenas que seja um atleta preocupado e que se tenha dirigido à Casa do Cinema para fazer o trabalho de casa. Qual aluno de Robert J. Oppenheimer, o lateral da Académica deve ter entrado na sala de cinema com um pequeno bloco e uma caneta, de forma a conseguir retirar toda a informação possível que lhe permitisse construir a sua pequena bomba atómica. Fazendo do Bolão o seu Los Alamos, acredito que Francisco Ferreira tenha treinado até à exaustão para poder aperfeiçoar o brinquedo. No decorrer da partida, ainda na primeira parte, tentou dar-lhe uso, mas sem sucesso – o tiro saiu ao lado e não causou mossa. Mais tarde, Chico viu-a pingar ali na meia-lua em frente à grande área e decidiu, numa fração de segundo, fazer os cálculos necessários: tirou as medidas à bola, calculou a força que tinha no pé, sentiu a intensidade do vento, fez pontaria e… BUM! Esta bomba, ao contrário da malvada americana, é inofensiva (pelo menos para aqueles que não seguem a legião sportinguista até à equipa secundária) e teve apenas o efeito de fazer explodir de alegria a bancada vestida de preto. Resta saber se, à semelhança do “pai da bomba atómica”, o jogador academista também teve influências comunistas, já que na noite anterior teve a oportunidade de, a poucos quilómetros do terreno de jogo, fazer o aquecimento na Festa do Avante.

Uma Briosa com sinal “+”

Numa altura ainda precoce do campeonato, parece-me difícil dizer que Tiago Moutinho não tem mãozinhas para o Ferrari que conduz. Se no início da temporada parecia que tinha falhado o diagnóstico e tentava insistir numa fórmula que não resulta, ao longo das jornadas o técnico da Briosa tem-se revelado cirúrgico nas alterações que faz ao onze. Depois de na última semana o 4-3-3 se ter revelado eficaz, a decisão foi manter o esquema e operar uma pequena alteração (que, embora forçada pela expulsão de Aílson no último jogo, resultou na perfeição – D’Avilla é um caso sério). Da formação com que começa a jogar, a única dúvida permanece no central Miguel Rodrigues, que parece não dar tanto quanto aquilo que conhecemos de Diogo Costa.

A história do jogo é simples: a Académica esteve sempre por cima, com bola e sem deixar respirar. O primeiro golo apareceu com naturalidade por intermédio de Tiago Veiga, que, numa daquelas oportunidades que só aparecem uma vez muito de vez em quando, não vacilou. Dava a entender que a Académica tinha descido à grande Lisboa para vir passear, mas, como sempre, as coisas nunca são assim tão fáceis – descoordenação da defesa em momento crucial levou ao 1-1. O jogo arrastou-se, bem pesado e violento, até que, já na segunda metade, Chico Bala veio desatar o nó à lei da bomba. No final, Sêco ganhou pénalti e Perea teve a oportunidade de matar a partida. A fechar um encontro em que esteve muito apagado, o colombiano não conseguiu bater Callai.

A Académica chega à quinta jornada invicta, na segunda posição da tabela classificativa e a jogar bom futebol. Esperamos que seja para durar.

 

(Fotografia: Associação Académica de Coimbra / Organismo Autónomo de Futebol)

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