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Super Bock Super Rock 2023: As virtudes da música pop no 3º dia do Meco.

Regresso, ao fim de 4 anos, a um sítio tão querido a este festival, a Herdade do Cabeço da Flauta. No último dia do Super Bock Super Rock (SBSR), dia em que a RUC esteve presente, encontraram-se no recinto cerca de 20 mil festivaleiros.

Em fórmulas de sucesso, os grandes festivais de verão equacionam as pessoas e a música  em doses que não se amontoam, tanto para o desejado sucesso de bilheteira como também para o “passa-palavra” (nos dias de hoje on-line): uma variável que dita muito o peso que um enredo festivaleiro causa nas pessoas. Animadoras ou desconcertantes, as opiniões movem investimentos e mudanças nos recintos, e a busca pela música das multidões continua. O Super Bock Super Rock está num impasse matemático em que as pessoas não vêm em demasia, mas enchem o recinto, e a música não enche as medidas, mas vem em quantidades industriais. E o mainstream tem muito que se lhe diga.

Ezra Collective abriram a pista de dança

Num recinto soalheiro e numa tarde quente de verão, os Ezra Collective surgiram no palco principal para iniciar as festividades, e a recepção foi calorosa. O quinteto de jazz britânico era um nome aguardado pelo público e, apesar de não existir uma enchente neste concerto, (algo expectável para um concerto pelas 17 horas), a energia e boa disposição dos Ezra Collective não ficou comprometida. No grande ecrã do palco lia-se: “Super Bock is where I’m meant to be”. A missão da felicidade cumpriu-se e a interação com o público não foi esquecida, apelando à libertação de movimentos sem vergonha.

Os Ezra Collective comprovaram o que já todos suspeitavam: o seu talento enquanto músicos. Balançando o jazz e o afrobeat, entregaram-nos as harmonias ideais para este início de tarde. 

Intimista música de fundo de Tomás Wallenstein

Paragem no palco dedicado à música nacional, por onde já tinha passado Surma e Irma nessa mesma tarde, para assistir ao concerto de Tomás Wallenstein. Já com o sol de final de tarde, o vocalista dos Capitão Fausto surgiu de óculos escuros e roupão florido, que ganhava vida sempre que corria uma pequena brisa.

A acompanhar o artista estava apenas um piano de cauda, continuando a linha minimalista deste projecto a solo de Wallenstein. Na sua simplicidade e voz amiga, o músico conseguiu prender atenção, interpretando temas dos seus Capitão Fausto, Tim Bernardes ou Cartola, e deixando notas de apreço pelo festival. À parte do público aficionado, muitas pessoas quiseram aproveitar para conversar e beber um copo durante o pôr do sol, com o roupão de Wallenstein a ser soprado pela poeira seca do Meco e a consumir a energia da plateia. 

A efusiva Biig Piig despertou os festivaleiros

Salto a um dos ditos palcos secundários do festival para assistir à estreia da artista irlandesa, Biig Piig, em Portugal. Começando com temas mais amorosos, com um quê de neo soul, Biig Piig foi encaminhando o seu concerto por ritmos bem animados, até chegar ao pico energético, que nos fez dançar e pular com faixas mais electrónicas. Contudo, esta excentricidade da música de Biig Piig foi equilibrada exemplarmente com a simplicidade que se via em palco. Os visuals eram apenas compostos pelo nome da artista, com um efeito 3D e metálico. Por vezes, surgiam alguns apontamentos de cor, como lilás e verde, em harmonia com as luzes de palco. A juntar à artista em palco, estavam quatro músicos, como a portuguesa Raquel Martins na guitarra, e que trouxeram um pouco de jazz a este concerto. Mas não foi por isso que o foco deixou de estar em Biig Piig, que nos mostrou do que é feita, com a sua energia contagiante e a irradiar boa disposição. 

As cores vibrantes de Kaytranada a iluminarem o início da noite

Este último dia de festival foi também marcado pelo regresso de Kaytranada a Portugal e ao Meco, por onde já tinha passado na edição de 2019. O artista de Montréal levou-nos a dançar do dia para a noite, com os seus conhecidos beats, recuperando temas do álbum de estreia “99.9%”, que continua a ser o seu trabalho mais aclamado. Com o aproximar da noite, começou a sentir-se uma maior adesão do público ao recinto, em particular a este palco, confirmando o sucesso do artista na cultura pop.

Com um espectáculo visual bem forte, estando rodeado por um set de iluminação vistoso, Kaytranada deixou-nos animados para começar a última noite de festival, já que antecedia o tão esperado Steve Lacy. Mas foi também com o anoitecer que este espectáculo de luzes acabou por funcionar melhor, tornando as cores ainda mais vibrantes. Os outros trabalhos do artista não ficaram esquecidos, como o caso de “Kaytraminé”, o novo álbum homónimo editado este ano e que junta Kaytranada e Aminé numa exploração das suas potencialidades enquanto músicos e produtores. Não diríamos que tenha sido uma atuação marcante, mas não desiludiu a enchente de festivaleiros que ali se juntou para se balançar ao ritmo do som digital de Kaytranada. 

Steve Lacy e a sua guitarra

As expectativas para o penúltimo concerto do palco principal eram elevadas, e via-se pela enchente da plateia. Steve Lacy, o cabeça de cartaz desta noite, escolheu o Super Bock Super Rock para se estrear em Portugal.

Dois grandes ecrãs luminosos surgiram atrás de Steve Lacy, mostrando em grande plano a cara do artista. O foco era Lacy, com um mono a encobrir os músicos que o acompanhavam. Perifericamente, conseguia-se ver um baterista preciso e desenfreado, e um baixista perdido em grooves, em que tudo saía das costas de Steve Lacy, para o público. A postura primadonna, comum entre alguns artistas deste calibre mediático, do guitarrista dos The Internet não desencorajou a audiência. Lacy mostrava descontentamento pelo rótulo TikTok carimbado à sua discografia, e o hino “Bad Habit” soou com mais intensidade vocal que qualquer outro tema do concerto, mas a qualidade do seu projeto aniversariante “Gemini Rights” (um ano de existência síncrono com a data, uma ocasião bastante feliz) fez-se notar desde “I Give the World” a “Buttons”. R&B e lo-fi pelo homem de óculos escuros a cantar (quase) sempre com uma guitarra por perto. 

Um concerto com imperfeições naturais que o público recebeu com pouco julgamento, e boas canções aplaudidas em furor.Steve Lacy soube terminar o concerto e agradar à massa humana que ali se juntou para o ver actuar, retirando-se com “Dark Red”, outro êxito a embalar uma despedida fervorosa.

Teremos sempre Paris com os L’Impératrice

Despedida efusiva foi também o último concerto da noite no palco secundário. Ao cair do pano, os L’Imperatrice surgiram com corações luminosos palpitantes e parou tudo para escutar o primeiro acorde. A partir daqui não houve um único momento de descanso para os espectadores desta performance, que durante uma hora fizeram qualquer um dançar e gastar todas as energias restantes.

Numa clara emoção por regressarem a Portugal, sentiram o amor recebido por quem os escutava atentamente, enchendo os corações palpitantes do sexteto parisiense. Com uma qualidade inigualável naquela noite de concertos, o recinto do SBSR ouviu um pouco de tudo por parte dos L’Impératrice. Mesmo só tendo dois álbuns editados, houve espaço para oscilar entre o groove, funk, nu-disco, french touch, pop psicadélico … mas sempre com uma coesão perfeita.

Os L’Impératrice já habituaram o público português a concertos de uma qualidade exímia, e a prova disso foi esta noite da Herdade do Cabeço da Flauta. Teremos sempre Paris. Teremos sempre os L’Impératrice

 

Fotografias por Maria Nolasco

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