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Augusto Santos Silva: “Se fosse jovem, detestaria que me dissessem que os partidos não me acarinham. É uma conversa paternalista.”

Presidente da Assembleia da República afirma que compete à nova geração “encontrar mensagens políticas que exprimam os seus anseios”, criticando propostas de implementação do voto eletrónico e de descida da idade do voto para que “eles [jovens] votem mais”.

Na sequência da entrega do prémio António Barbosa de Melo para Assuntos Parlamentares, que teve lugar na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (FDUC), Augusto Santos Silva, presidente da Assembleia da República (AR), esteve de visita ao edifício-sede da Associação Académica de Coimbra (AAC), onde concedeu uma entrevista à Rádio Universidade de Coimbra (RUC).

“Mercado [da habitação] está muito distorcido contra as pessoas que precisam de alojamento.”

Como não podia deixar de ser, atendendo ao estatuto editorial da RUC, o primeiro tema a ser discutido ao longo da entrevista foi o Ensino Superior. Apesar de reconhecer a não universalidade do acesso aos mais altos níveis de ensino, Augusto Santos Silva, responsável pela pasta entre 2000 e 2001 (altura em que assumiu o Ministério da Educação), aponta ao progresso desde o 25 de abril de 1974. Segundo afirma, o número de estudantes no Ensino Superior é hoje oito vezes maior do que no período da ditadura (400.000 vs 50.000), alcançando valores comparáveis ao nível da média da OCDE. Para isso contribui, no seu entender, a massificação do ensino superior – presente em todos os distritos e regiões autónomas – considerando que as instituições estão hoje dotadas de “mecanismos de ação social, bolsas de estudo e benefícios”, dos quais destaca a diminuição do valor das propinas ao longo dos últimos anos.

No entanto, o professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Porto não esquece aqueles que, por diversos motivos, são incapazes de atingir o seu potencial máximo do ponto de vista académico, salientando a questão da habitação estudantil. Embora ressalve que o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) surge como uma ajuda para as instituições de ensino superior (tanto a Universidade de Coimbra como o Instituto Superior Politécnico vão criar duas novas residências para estudantes, por exemplo), Augusto Santos Silva acredita que é necessária uma regulação do mercado imobiliário que não deixe que os mais carenciados sejam privados de estudar.

“Recuso-me a acreditar que o problema [no acesso ao mercado de trabalho] seja o excesso de qualificações”

O processo de Bolonha foi a última paragem na discussão sobre o Ensino Superior. Neste tema, Augusto Santos Silva mantém a posição assumida antes da transição, acreditando que este “foi um passo em frente” para o qual assume ter contribuído decisivamente. Confrontado com um aumento do abandono das atividades desportivas e com a diminuição da participação em atividades culturais em virtude do processo (algo que tem especial impacto na Associação Académica de Coimbra), o militante do Partido Socialista mostra-se surpreendido, dada a tendência de aumento do consumo cultural em pessoas com mais estudos, esperando que esta menor participação não esteja a afetar a construção pessoal da nova geração. Assim, o presidente apela à participação dos estudantes em iniciativas como a Rádio Universidade de Coimbra, que “é uma formação muito mais importante para o futuro do que aprender de cor o Código Civil”.

O presidente da Assembleia da República crê que “a economia portuguesa tem de gerar ofertas de emprego que correspondam à estrutura de qualificações que hoje tem a nossa juventude”, rematando que “qualificações nunca são demais” e que, por isso, a adaptação tem de ser de quem emprega. Afirmando que a qualidade de formação universitária e politécnica nacional “não está muito afastado dos melhores padrões europeus”, o antigo deputado alerta para o perigo da ‘fuga de massa cinzenta’ para os países membros da União Europeia – algo que afirma ser um direito, tendo em conta a livre circulação permitida no espaço Schengen – em prejuízo de Portugal.

“Quando tinha 16/18 anos dizia: «Pá, nós tratamos de nós. Deixem-nos crescer e escolher como participamos.»”

A participação política dos jovens acabou por se revelar como tema maior da entrevista conduzida no estúdio principal da RUC. Em relação a esta questão, Augusto Santos Silva é peremptório: “Detesto paternalismos”. Para a segunda figura de Estado que afirma ter dificuldade em compreender a forma como os jovens se relacionam com a política, é necessário que as famílias políticas tradicionais (que têm tido muita dificuldade em adaptar-se) tenham mensagens políticas mais apelativas, reforçando que “é aos jovens que compete decidir o futuro” e, por isso, são eles que devem participar de forma a “exprimir os seus anseios”. O presidente da Assembleia da República lembra que a probabilidade de votar aumenta à medida que se progride em idade, ficando a dúvida se se trata de uma questão pessoal ou geracional.

Embora entenda uma relação com o voto menos próxima do que aquela que mantinham (e mantêm) aqueles que passaram pela ditadura, Santos Silva indica que a participação política não se esgota nas urnas. Nesse sentido, o presidente recorda que é nesta faixa etária que o ativismo é mais expressivo e aponta que a democracia “é uma casa suficientemente larga” para abarcar as mais variadas formas de ação, como são exemplo as petições. O ex-Ministro dos Negócios Estrangeiros realça ainda que o exercício democrático deve ser praticado desde cedo nas escolas, rejeitando uma “Organização Política e Administrativa” (disciplina lecionada no Estado Novo) da Democracia como possível estímulo para a participação cívica.

Para ouvir a entrevista na íntegra pode clicar no link acima ou aceder através do nosso Spotify.

 

 

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