Afonso Pedrosa: “Uma coisa garanto, se algo acontecer de muito mau (na futura SAD) a Académica não vai ficar numa situação pior”
Pedro Andrade e Rui Rodrigues estiveram na moderação de um programa que procurou ver respondidas algumas das maiores dúvidas dos sócios e adeptos da Académica. SAD tem objetivo de reerguer o clube.
A equipa do Prognósticos recebeu Afonso Pedrosa, vice-presidente da Associação Académica de Coimbra / Organismo Autónomo de Futebol, no programa desta segunda-feira, dia 9 de maio.
O projeto da futura Sociedade Anónima Desportiva (SAD) foi o principal tema do programa moderado por Pedro Andrade. Numa altura de drama desportivo e financeiro, a apresentação da investidora americana De Anna Guerreiro em abril passado, gerou controvérsia no seio da massa adapta academista. Neste sentido, a primeira parte do programa foi dedicada ao dossier “Athlon”. Afonso Pedrosa começou por admitir que hipotéticos investidores para um projeto de SAD minoritária são “raros”: “Não existem interessados aos pontapés para um projeto como o atual”, concluiu. O advogado e vice-presidente da AAC/OAF explicou que a atual direção entrou em contacto pela primeira vez com o grupo Athlon por via de dois empresários brasileiros, que tinham encetado conversações para a formação de uma SAD durante o ano de 2020.
“Não existem interessados aos pontapés para um projeto como o atual”
Desde a já infame conferência de imprensa do passado mês abril existiam duas perguntas que estavam na boca de praticamente todos os sócios e adeptos da Académica: Quem é afinal De Anna Guerreiro e o que faz a Athlon Office. Afonso Pedrosa sublinhou que a juventude da empresa (criada em 2020), contrasta com a experiência de De Anna Guerreiro, “uma pessoa conhecida nos Estados Unidos no âmbito de investimentos”, explicou o advogado conimbricense. Relativamente ao escopo de negócios da empresa com base em Tampa Bay, Florida, Afonso Pedrosa explicou que a Athlon é um “Family Office que pretende que atletas profissionais invistam no desporto”.
O que é um family office? Fizemos a nossa investigação e segundo a empresa especializada em consultoria e auditoria financeira, Delloite, um Family Office “é uma solução dedicada para a gestão holística da riqueza familiar.” Segundo a mesma fonte “não existe definição de family office.” Pode-se, no entanto, dizer que é um veículo “que apoia a família no dia-a-dia da administração e gestão dos assuntos da família e da estratégia a longo prazo.” O que sabemos, segundo Afonso Pedrosa, é que existe uma ligação Adidas/ Atlhon.
Pessoa ligada ao universo Adidas pode investir na Atlhon
O vice-presidente da AAC/OAF explicou que o neto do fundador da Adidas, Adi Dassler quer entrar no capital da Atlhon e que deseja colocar De Anna Guerreiro num lugar de administração no seu “family office”. Esse facto associado à presença de De Anna Guerreiro em Coimbra no dia da confirmação da descida de divisão, representam uma garantia para Afonso Pedrosa da idoneidade dos investidores. Além disso, o jurista e dirigente da Académica recordou que a Atlhon é uma empresa regulada pela SCC (U.S. Securities and Exchange Commission) uma Comissão que nas suas palavras funciona como uma “espécie de CMVM dos Estados Unidos”, mas “muito mais rigorosa quer na entrada, quer na aplicação dos fundos”, acrescentou Afonso Pedrosa. Tudo dados que reforçam na sua opinião a confiança no “parceiro” americano.
De Anna Guerreiro é a fundadora e CEO da Vinecrest Investments LLC, uma empresa, que fornece investimento estratégico para a produção, tecnologia, biotecnologia, petróleo & gás, mineração e agronegócio
Questionado sobre o risco desta mudança societária e de um eventual extremar de posições entre investidora e a Académica, Afonso Pedrosa foi claro: “Se acontecer alguma coisa de muito mau ou mau, na perspetiva do negócio em si, uma coisa garanto, a Académica não vai ficar numa situação pior daquela que está hoje”.
Afonso Pedrosa recordou que a atual direção de Pedro Roxo negociou um novo protocolo com a DG/AAC em novembro de 2021. Futura SAD respeita os limites impostos pela “Casa-mãe”.
No sentido de salvaguardar a posição da Académica Afonso Pedrosa deixou algumas indicações sobre determinadas contrapartidas firmadas no contrato com a empresa americana. “O canelão e a balada de Coimbra estão no contrato, por exemplo”. Por outro lado, do ponto de vista do funcionamento do clube, Afonso Pedrosa salientou dois pontos: A manutenção da maioria no capital social (51%) e a manutenção da maioria no Conselho de Administração e no Conselho Fiscal.
O investimento inicial vai ser canalizado para cobrir o passivo do clube. Pagar dívidas a fornecedores e trabalhadores é uma prioridade
Da identidade da investidora a conversa mudou ligeiramente de tema e focou-se em aspetos puramente financeiros. Afonso Pedrosa explicou que a investidora vai assegurar um investimento inicial de 4.900.000,00€. Este investimento vai ser realizado de forma faseada até 31 de outubro de 2023. Subsequentemente, a parceira americana vai assegurar um valor mínimo de orçamento anual na equipa de futebol profissional de EUR 1.200.000,00, para a Terceira Liga; EUR 3.000.000,00, para a Segunda Liga; e EUR 5.500.000,00 para a Primeira Liga. Afonso Pedrosa sublinhou que o investimento inicial é relativo a apenas 49% do capital social da futura SAD, um valor bastante superior ao verificado em outras aquisições de clubes em Portugal, nomeadamente em equipas da primeira liga, onde se verificou a venda da maioria do capital social da sociedade. Porém, no que toca aos detalhes ainda há alguns acertos a fazer, não existindo ainda um acordo final entre a Académica e a investidora americana. Segundo Afonso Pedrosa, esse atraso é resultante do parecer da Comissão de Acompanhamento, que obrigou à revisão de alguns detalhes contratuais.
Assuntos como o investimento de ativos, implementação de política comercial, compra e venda de jogadores e celebração de contratos com atletas e equipa técnica vão exigir unanimidade no Conselho de Administração
Outro dos pontos do contrato que foi alvo de esclarecimento por parte de Afonso Pedrosa foi a cláusula que exige unanimidade sobre um “conjunto de assuntos”. O jurista e dirigente da Académica relembrou que um acordo de investimento numa Sociedade Anónima Desportiva pressupõe contrapartidas, ou seja, nas suas palavras, exige “dar alguma coisa em troca ao investidor”. Questionado sobre os assuntos onde a unanimidade vai ser exigida Afonso Pedrosa enumerou as matérias: “investimento de ativos, implementação de política comercial, compra e venda de jogadores e celebração de contratos com atletas e equipa técnica.” O advogado e vice-presidente de Pedro Roxo salientou, no entanto, que esta exigência de unanimidade é sinónimo de “participação” e não de decisão unilateral por parte do parceiro americano.
O investimento da empresa americana Atlhon surge num momento de enorme dificuldade desportiva e financeira do clube. Os resultados dentro do campo têm sido tão maus como os resultados financeiros, com prejuízos avultados nas tabelas contabilísticas e com demasiados golos sofridos na tabela classificativa. Para Afonso Pedrosa a Académica “perdeu há muito o comboio para os clubes da primeira liga”, estando neste momento “muito distante dos comboios da segunda liga”, sublinhou o vice-presidente da Briosa. Na opinião de Afonso Pedrosa é necessária uma reorganização da Académica, que só é possível na sua perspetiva com a entrada de um investidor no capital do clube: “Se olharmos para todas as outras formas jurídicas estas não nos dão qualquer garantia”, concluiu Afonso Pedrosa.
Na última década têm surgido diversos bons e maus exemplos de cada tipo de sociedade comercial. No lado do insucesso os casos foram mais mediáticos. Este mediatismo é explicado não só pela forma como a mudança estatutária acelerou a queda desses clubes, como ocorreu com o Beira Mar, Olhanense ou mais recentemente, com o Desportivo de Aves, mas também pela forma como alguns desses clubes passaram por crises identitárias, como aconteceu com a celebre rutura do Belenenses com os investidores titulares do capital social da SAD (Codecity). Na maioria desses casos há um denominador comum: O desespero.
“Nos últimos três anos tivemos propostas em teoria para a aquisição de capital, mas que não eram minimamente adequadas para a identidade da Académica”.
A discussão sobre o modelo societário da Académica não é nova e já foi inclusive alvo de um referendo em 2013, ano em que o regime das sociedades desportivas estabeleceu a obrigatoriedade para todos os clubes que disputem competições profissionais a utilização de um de dois modelos: A Sociedade Anónima Desportiva (SAD) ou Sociedade Desportiva Unipessoal por Quotas (SDUQ), o modelo escolhido pelos sócios nesse mesmo ano. Para Afonso Pedrosa a mudança societária não exige necessariamente uma mudança dos Estatutos da AAC/OAF (a última mudança é de 2010, ou seja, é anterior à mudança de figurino societário).
Afonso Pedrosa afirma que não é necessário realizar uma mudança estatutária. No entanto, o atual pacto social terá de ser substituído
O funcionamento da Académica rege-se por dois documentos: Os Estatutos da Associação Académica de Coimbra / Organismo Autónomo de Futebol, que são constituídos por um conjunto de regras e princípios que orientam e regulam o funcionamento da Instituição e os Estatutos da Associação Académica de Coimbra / Organismo Autónomo de Futebol, SDUQ LDA, que foram celebrados, por documento particular, no dia 19 de junho de 2013 na antiga Academia Dolce Vita. O primeiro documento não exige, de facto, uma mudança em caso de alteração societária, tal como Afonso Pedrosa explicou no Prognósticos de ontem. Será necessário, no entanto, a celebração de outro pacto social, que regule as responsabilidades da nova Sociedade desportiva, um dado não referido por Afonso Pedrosa.
“Embora a situação seja desesperante esta proposta não foi pensada nem negociada com base no desespero”
Questionado sobre esses exemplos negativos Afonso Pedrosa salientou que as negociações com a parceira americana não foram feitas em desespero. “Embora a situação seja desesperante esta proposta não foi pensada nem negociada com base no desespero”. Afonso Pedrosa vai mais longe e afirma que se a negociação tivesse sido contaminada por um sentimento de desespero a atual direção já teria apresentado outro investidor ao longo do mandato, algo que não o fez porque esses investidores não eram adequados para um clube como a Académica. “Nos últimos três anos tivemos propostas em teoria para a aquisição de capital, mas que não eram minimamente adequadas para a identidade da Académica”.
“A investidora não quer controlar de fora, quer vir e reerguer desportivamente a Académica.”
Sobre as diferenças entre o atual projeto para outros que chegaram às mãos de Pedro Roxo ao longo dos últimos três anos, Afonso Pedroso defende que a atual proposta respeita a Académica. O vice-presidente do clube sublinha que a investidora tem uma perspetiva focada “na cidade, nas instituições de Coimbra.”
A entrevista a Afonso Pedrosa pode ser escutada no Spotify (Prognósticos) ou então no separador “Podcasts” da Rádio Universidade de Coimbra.