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“Saber Ouvir”: A dança inesperada entre a justiça e as artes

A justiça e as artes, e a importância da escuta em ambos os ofícios foram o foco desta conversa. Falou-se de verdade, das redes sociais, de presença, de expectativas e tempo, numa acepção partilhada sobre o relacionamento inesperado entre a justiça e as artes e percebeu-se de que forma o “Saber Ouvir” serve o exercício destas atividades nas suas múltiplas formas.

O programa Observatório do dia 26 de maio contou com a presença da coreógrafa Leonor Barata e do juiz desembargador Luís Mendes num conversa inserida no Fórum Saber Ouvir do VI Ciclo de Concertos de Coimbra.

De uma forma geral, ambos os convidados concluem que é necessário saber ouvir, saber fazer-se ouvir e saber o que não ouvir.

Desde logo, Leonor Barata identifica a dança como um exercício de escuta permanente. A escuta é, assim, um dos principais sentidos no trabalho do coreógrafo, relacionando-a intrinsecamente com o movimento. Já na pedagogia, actividade que a coreógrafa também desempenha, a escuta é importante para a partilha com os outros e para que a comunicação aconteça.

Por seu lado, Luís Mendes estabelece uma associação, entre o Tribunal da Relação e as artes pois, enquanto casa de audiência para o povo conseguir justiça (na sua génese), a instituição é um grande palco que tem a figura do juiz como artista. A este respeito, a coreógrafa intervém para citar Brecht: “ Todas as artes contribuem para a grande arte que é viver”.

Leonor Barata: Nas artes, “não há uma verdade”.

Ao contrário do que acontece no campo da justiça, Leonor Barata contrapõe que no mundo das artes a verdade factual não é perseguida e a efabulação é fundamental para o processo artístico.

Num universo mais concreto e actual, as redes sociais serviram como paradigma à atividade da magistratura pelo seu tempo e respostas. A este respeito, Luís Mendes refere que é necessário tempo para o exercício da justiça e para a reflexão a que obriga. O mesmo paralelismo estabelece Leonor Barata sobre a importância do tempo para o processo da criação, a propósito da reflexão proposta acerca do imediatismo das redes sociais e a tendência cada vez mais proeminente para a produção de sentenças e opiniões na sociedade.

Para o magistrado, existe um problema de expectativas na sociedade que, muitas vezes se relaciona com patologias do próprio sistema e, que por sua vez gera sempre uma insatisfação transversal. O juiz aproveita ainda, a este respeito, para referir que a justiça em Portugal não está organizada “para ser mais eficiente” com a transformação para os novos meios e instrumentos tecnológicos.

Luís Mendes: “Para saber ouvir também é preciso saber não ouvir”.

Se, por um lado, Leonor Barata acredita que as ferramentas tecnológicas são vantajosas para se escutar ainda mais a cultura, por outro receia o perigo da substituição “dos teatros pelos sofás”. Ambos os convidados concordam sobre a necessidade impreterível da presença física e do contacto entre as pessoas. Partilham, assim, da mesma reflexão: há que haver capacidade para acompanhar as transformações na sociedade. Apesar de se reconhecerem as vantagens que as novas formas de contacto à distância acarretam para a sociedade, não só identificam as suas ameaças como também reconhecem que é necessário saber filtrar o ruído.

A conversa pode ser escutada na íntegra no nosso serviço de Podcast, ou em alternativa, no Spotify (Observatório).

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