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02.02.2025POR Isabel Simões

Gerações futuras vão acusar-nos do pouco cuidado com rios e regiões costeiras?

Vendo o futuro comprometido, as próximas gerações vão culpar as atuais por não terem cuidado dos rios e regiões costeiras e de não terem minimizado consequências das alterações climáticas.  

É essa a convicção de Ricardo Eufrásio, médico de saúde pública. A falta de atenção do homem para com a natureza que tem levado a construir em dunas e arribas pode, no futuro, segundo o médico, levar à necessidade de deslocalizar populações e mesmo mudar de sítio infraestruturas críticas de que os hospitais instalados em orlas costeiras são apenas um exemplo.

Estamos preparados para isso?

Há muitas dúvidas. Se é certo que a proteção civil está muito atenta à proteção e segurança das populações em situações de emergência, a verdade é que alguns populares continuam a não respeitar os alertas e expõem-se ao perigo de forma deliberada.

E sempre que o mar avança numa determinada zona, as soluções passam por tentar mitigar as consequências com deslocação de areia (que muitas vezes tarda) ou construção de infraestruturas de contenção que se vão degradando com o tempo.

Nuno Pinto, comandante da Proteção Civil na Figueira da Foz lembrou na mesa-redonda intitulada “Ordenamento Costeiro- realidades e necessidades do Litoral Centro de Portugal”, promovida pelo laboratório MAREFOZ, que na última tempestade, houve quem ignorasse o alerta e se dirigisse ao molhe norte da Figueira da Foz sujeito a uma vaga poder levá-lo. Segundo o comandante há países, em que, se nesta situação houver necessidade de socorro, o popular tem de pagar as custas.

O comandante revelou que em breve na Figueira da Foz haverá um aviso sonoro em toda a costa abrangida pelo seu comando para avisar populações sobre um possível ‘tsunami’.

Quando há uma catástrofe, quem são os mais prejudicados?

Ricardo Eufrásio não tem dúvidas. As populações mais desfavorecidas em situação de tragédia ficam ainda mais pobres. A recuperação dos lugares atingidos pelo Katrina em Nova Orleães demonstram isso, contou o outro convidado do MAREFOZ. A intervenção nos bairros ricos foi muito diferente da que se fez nos bairros mais pobres.

Para além da contaminação das águas, o médico de saúde pública chamou a atenção para a necessidade de investir na saúde mental, quer das populações afetadas, quer dos profissionais de emergência.

Deu exemplo dos incêndios de 2017 em que aqueles que “enfrentaram a besta” ficaram destroçados com o que viveram, viram e combateram.

Estamos preparados para as alterações climáticas? 

A Proteção Civil tem feito o seu papel e apela a que as instituições tenham os seus próprios planos de emergência. Há também a necessidade de se realizarem simulacros sem aviso para testar a operacionalidade dos meios e os comportamentos da população.

Por outro lado, a existência de inundações em leito de cheia ou por avanço do mar na orla costeira implica que não mais se permita construção nessas zonas.

João Martins, do Departamento de Ordenamento da Câmara Municipal da Figueira da Foz considera que o conhecimento que existe já não permite a construção nesses locais, ainda assim entende que há ajustes a fazer no Plano de Gestão de Riscos e Inundações.

Sabia que há uma lei de Restauro na União Europeia? 

O Conselho Europeu adotou em 17 de junho de 2024 o Regulamento relativo ao restauro da natureza, o primeiro deste género.

A legislação europeia foi trazida ao debate por Alexandra Aragão do Instituto Jurídico da Universidade de Coimbra.

Segundo a página do Conselho Europeu, “o regulamento pretende estabelecer medidas para restaurar, pelo menos, 20% das zonas terrestres e marítimas da UE até 2030 e, até 2050, de todos os ecossistemas que necessitam de restauro”.

A jurista explicou em pormenor o que a UE determina.

O Decreto-Lei n.º 117/2024 e que o público conhece como Lei dos Solos foi aprovado a semana passada. A legislação tem merecido ampla discussão na sociedade portuguesa. Como se ouviu no debate “os telefones nos Municípios não têm parado de tocar”, uma vez que cabe aos Municípios e Assembleias Municipais aceitar ou não passar a urbano um terreno rústico.

Para Alexandra Aragão “Infelizmente, em Portugal às vezes, as leis não vão no bom sentido”, como a lei 117/2024 que permite transformar em terrenos urbanos terrenos rústicos.

O debate “Ordenamento Costeiro- realidades e necessidades do Litoral Centro de Portugal” teve lugar no dia 30 de janeiro e assinalou os nove anos do Laboratório MAREFOZ.

Marcaram presença quatro convidados, de diversas áreas de atuação: João Martins, do Departamento de Ordenamento da autarquia figueirense; Nuno Pinto, comandante da Proteção Civil; Ricardo Eufrásio, médico de saúde pública e Alexandra Aragão, docente e investigadora do Instituto Jurídico da Universidade de Coimbra

Como disse Alexandra Aragão, a falta de ação atempada dos responsáveis, aos diversos níveis, tem levado muitos jovens para o ativista ambiental radical por temerem que o seu futuro esteja profundamente comprometido.

O debate contou com moderação da Rádio Universidade de Coimbra.

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